Adeus Serra do Cervo!

Você que lê este blog já me viu desistir de escrever nele uma outra vez, mas pelo motivo de não encontrar uma história que valesse a pena. Depois voltei atrás por saudades de falar de terra, de bichos e de meu estado de espírito nas serras. Bem, agora é definitivo! Não voltarei mais a este espaço para descrever minha lida pelas serras do Cervo, simplesmente porque não mais estarei por lá. Se vier a escrever sobre minha longa jornada por cada recanto daquele refúgio o será em outro blog, mas para dizer das saudades, reminiscências e imagens indeléveis desta vivência. Este blog será como uma árvore esquecida na retina do viajante em um trem que dispara pelo campo. Ou como mais uma lápide no grande cemitério da web. Grato àqueles que me brindaram com sua leitura. Antes de fechar de vez este espaço farei uma última blogagem, em respeito aos que me seguem. Manterei, limitadamente, o blog http://levileonel.blogspot.com

domingo, 15 de novembro de 2009

O diário de Roquentin e o boato de si mesmo!

“É isso que tem que ser evitado; é preciso não colocar estranheza onde não existe nada. Creio que é este o perigo. Quando se faz um diário: exagera-se tudo, vive-se à espreita, deforma-se constantemente a verdade. Por outro lado, é certo que posso, de um momento para outro – e precisamente em relação a esta caixa ou a qualquer outro objeto – experimentar novamente a impressão de anteontem. Tenho que estar sempre preparado; do contrário, ela mais uma vez me escaparia. [...] Naturalmente, já não posso escrever nada de preciso sobre aquelas histórias de sábado e de anteontem, já estou muto distanciado delas; só posso dizer que, tanto num caso como no outro, não houve nada do que se chama comumente um acontecimento. Sábado, os meninos brincavam com pedras, fazendo-as ricochetear, e quis imitá-los e jogar uma no mar. Nesse momento detive-me, deixei cair a pedra e fui embora. Eu devia ter um ar perdido, provavelmente, já que os meninos riram quando lhes dei as costas”. (Roquentin, escrevendo seu diário, em A Náusea).

Estou com Roquentin. Ao escrever diários deformamos a verdade, mas não mentimos; fabricamos a verdade, a partir desse não-acontecimento – esse cotidiano insosso, sem consistência e sem beleza especial; o fazemos se tornar bordado, retinente, luzidio. Não é que inventamos uma verdade; é que omitimos o geral em prol do detalhe; colocamos uma lente nele e o expomos aos olhos, enquadrado e emoldurado. Carregamos nas tintas aquilo que parece apenas entrevisto, difuso, mal delineado. Fazemos um conto da realidade; uma ficção com a vida. O diário não torna a realidade, por isso, artificial, mas sim, um boato de nossa própria vida. E onde há fumaça, há fogo, dizem. Assim, da fumaça da realidade que é o diário, podemos entrever algum fogo de acontecimento, de realidade – algo que talvez valha a pena contar para algum “querido diário”. Nossas vidas são tão desinteressantes, tão comezinhas, que um diário pode salvá-la da mediocridade; basta reinventá-la, sem mentir, imitando, talvez um humorista que diz: "Eu aumento, mas não invento!"