Adeus Serra do Cervo!

Você que lê este blog já me viu desistir de escrever nele uma outra vez, mas pelo motivo de não encontrar uma história que valesse a pena. Depois voltei atrás por saudades de falar de terra, de bichos e de meu estado de espírito nas serras. Bem, agora é definitivo! Não voltarei mais a este espaço para descrever minha lida pelas serras do Cervo, simplesmente porque não mais estarei por lá. Se vier a escrever sobre minha longa jornada por cada recanto daquele refúgio o será em outro blog, mas para dizer das saudades, reminiscências e imagens indeléveis desta vivência. Este blog será como uma árvore esquecida na retina do viajante em um trem que dispara pelo campo. Ou como mais uma lápide no grande cemitério da web. Grato àqueles que me brindaram com sua leitura. Antes de fechar de vez este espaço farei uma última blogagem, em respeito aos que me seguem. Manterei, limitadamente, o blog http://levileonel.blogspot.com

sexta-feira, 12 de junho de 2009

Feriado vai feriado vem...

Anteontem, numa viagem que normalmente se dá em três horas, meu ônibus gastou cinco horas e meia; Não por causa do excesso de veículos (que de fato havia!), mas por causa de um engavetamento com com vários carros, sendo o meu ônibus um dos responsáveis! Ficamos horas na Fernão Dias, entediados, impacientes, sob chuva milimétrica e fria, parecendo mais molhada que as chuvas de verão. Os pingos, no outono e inverno, não desabam. Eles deslizam uns apoiando-se noutros, mas sem juntarem-se. Ficam de ombros próximos, por causa de sua debilidade de tamanho. São fiapos de pingos; qualquer brisa e descem meio de resvalo, de lado, encharcando antes de molhar. Para usar a situação a meu favor, li alguns capítulos de “A teoria do amadurecimento de D. W. Winnicott” de Elsa Dias e o capítulo XXV de “Da pediatria à psicanálise” do próprio W. (para um curso de extensão que darei sobre delinquência – a tendência anti-social) e revi meu artigo sobre o Teatro Municipal de PA. Conversei com os vizinhos de poltrona: um deles veio de Marabá no Amapá (viajava desde o início da madrugada migrando de aeroporto a aeroporto até que embarcara naquele ônibus em direção a Boa Esperança. Noutra conversa fico sabendo que uma garota de dezessete anos aproximados estudava em SP para os vestibulares de medicina. Com seu boné estiloso, xadrez de branco e preto, manipulando concentradamente os apontamentos de matemática, que era seu “grande problema com os vestibulares”. Boa de papo, sorrindo acolhedora com seus grandes dentes alinhados, brancos e limpos, com o anoitecer ela foi arrefecendo de cansaço. Escureceu umidamente. O ônibus finalmente arrancou e ela puxou o boné sobre os olhos. Um a um, praticamente todos mergulhamos em nossos mundos feitos um tanto de sonolência, outro tanto de pensamentos, reminiscências e esperas. Ontem, depois de ficar afundado, por horas, no mundo lacunar do sono e dos sonhos, acordei restaurado. Pela janela que dá para os pinheiros, azeitonas do ceilão, roseiras e mangueiras, vi espessa cerração que dava a cada árvore aspecto espectral; mais se via seus contornos, que detalhes. Mas, como as conheço de nascimento, sei que uma é roseira amarela, outra é uma agave verde acinzentado, outra ainda, uma mangueira espada. Fiz o café da manhã, simples e eficiente; Vania levanta-se; Rabicho, Soneca, Kelly e Gabi são convidados a entrar. Eles também são alimentados; já calmos nas entranhas cada um procura seu lugar na casa para a dormitação que se anuncia. Lá fora começa aquela chuva fina, cujo ofício é encharcar o mundo... Sem condições para trabalhar a terra, fizemos nossas leituras da vez – eu li um capítulo do “Tratado da Eficácia” e outro de “O ser e o nada”. Para treinar o francês, “Madame Bovary”. Vania leu mais um pouco do “Tratado de ateologia” e em certo momento quer saber porque Michel Onfray diferenciou “teístas”, “deístas” (menos cegos) e “ateístas” (mais lúcidos). Veja na terça que vem http://www.levileonel.blogspot.com).

Mais tarde descemos a serra até a casa de Zé Maria e Amanda para um almoço aconchegante. Conversas mais ou menos esparsas com novos conhecidos e outros já conhecidos de um bingo no Clube Literário; tratamos um futebol para qualquer dias desses – o ridículo é que não jogo desde os treze anos de idade. Será um desastre que só dará video-cacetada e bola-murcha para apresentação em tevê para divertimentos dos espectadores. Pelo menos de minha parte a diversão estará garantida. É mais que certo que riremos a beça!
E depois, como continuou chovendo, escrevi e li. Além, é claro, de alguns cuidados domésticos, sem os quais fica impraticável morar... A noite um pouco de tevê assistindo um seriado brasileiro.

Hoje, 12, o dia amanheceu plúmbeo, como diziam os clássicos, frio, úmido; nenhuma brisa, o que mantem a temperatura razoavelmente mais alta que a de ontem. Daqui a pouco vamos a PA para a compra de provisões e ir à biblioteca da UNIVÁS. Neste momento, escrevendo estas linhas, chego a conclusão de que devo comprar um dicionário com a renovação ortográfica, para praticar e não passar apuros quando terminar o prazo para que todos a adotem. Já uso um pouco de memória, por ter lido um ou outro livro e artigo que já usam a nova ortografia, mas não é o suficiente. Tenho que aprender as regras gerais, senão terei que usar o dicionário muitas vezes por dia...

quarta-feira, 10 de junho de 2009

Véspera de feriado!

Amanhã, feriado! Hoje a tarde a loucura da saída de São Paulo; mais de milhão de carros espremidos nas avenidas e superavenidas paulistas em direção a praia, interior, outros estados. Todos tentando descansar um pouco, divertir-se um tanto, esquecer um algo. Mas não é simples assim, divertir, descansar, esquecer custam caro ao sistema nervoso, ao bolso, a existência... Mas, como esquecer as agruras faz parte da arte de continuar tentando ser feliz, lá vão todos passar por novos aborrecimentos para tentarem a felicidade... Deve ser porque a felicidade mora na praia, no campo ou na casa do vizinho! Roquentin, em A náusea, disse que narrar é melhor que viver. Talvez as pessoas sofram tanto para divertir-se, na obrigação de ter algo a narrar na segunda, a alguém, nem que seja para ele mesmo ou para os netinhos. Quem sabe a melhor parte dos feriados é olhar as fotografias e fabular...

terça-feira, 9 de junho de 2009

Diferença de temperatura!

Ao embarcar em PA para minha vinda semanal a SP, eu estava com bastante roupa! Agora, em meu consultório, depois de passar por um calor danado, metrô incluso, já instalado, me sinto bem, com um terço delas. É claro que alguém que mora a duzentos e trinta e quatro quilômetros do trabalho, passa por vicissitudes incomuns, dessa relação tempo-espaço-clima-clima-existencial, mas também usufrui de um olhar bastante diferenciado. Estou falando da diferença de temperatura existencial -ritmo emocional, angústia crônica, fadiga, desilusão, próprios de uma megacidade, versus ritmo sazonal - ligado ao clima, angústia da facticidade, cansaço físico, ilusão, próprios da vida enraizada no campo. Aqui não é o lugar de me explicar quanto ao que observo; sugiro ler de vez em quando o http://www.levileonel.blogspot.com onde repasso o assunto semanalmente. Meus pacientes me esperam...

segunda-feira, 8 de junho de 2009

Hoje, nespereiras, amanhã geléias de seus frutos adocicados!

Pouso Alegre: 17:34, segunda. Pois é, não dei sorte com a única lan aberta! Não postei ontem porque estava com problemas que nos impediam de entrar na rede; demoraria muito tempo e decidi postar hoje. Como já havia previsto, neste regime onde não tenho internet na serra as postagens sofrerão certa defasagem... Hoje, amanheceu e permanece um dia cinzento, com temperaturas baixas, cuja sensação térmica é ainda mais baixa por causa de um vento intermitente, cortante. De manhã, bem agasalhados, nos dirigimos, V. na enxada e eu na foice, para nosso pomar de nespereiras. Podamos, limpamos seu entorno e lhe demos o formato de taça, que facilita a entrada de ar e luz na copa. Isso nos renderá, para o verão, frutas naturais e geléias que comeremos no outono que vem. Agora vamos fazer a rotina de cuidados das nossas relações com a cidade: banco, uma visita rápida ao Luiz Henrique e sua escola, onde aprendemos dança de salão; irei ao museu para a continuidade do projeto de pesquisa e ao próprio teatro municipal.

Pouso Alegre: 11:00h, domingo. Passeio pela cidade que está cheia; ao passar pela praça central, ao irmos ao açougue do Roberto pegar ossos para nossos pupilos, nos deparamos com um conhecido movimento de fim de missa na catedral – pessoas aliviadas de seus pecados, de seus compromissos aos olhos da sociedade. Dá para adivinhar seu prazer antecipando almoços familiares e uma tarde em paz. Famílias inteiras – de netos a avós – concernidos, escusados pelo que passaram durante a semana de lida, preparando-se para a próxima, entremeio o alarido das crianças, a dormitação dos adultos e os sonhos dos jovens...

Na última sexta a serra amanheceu de ar limpo e a pouco mais de 4 graus de temperatura; na madrugada chegou a zero! Faz tempo que não sentia por aqui um frio desta ordem em maio. E veja que já estamos aqui há quinze anos, e morando regularmente a seis. No caminho para PA, onde faria consulta de rotina ao dentista, o para-brisa congelou e foi difícil fazê-lo transparente só com a água do limpador. Quando voltei – depois de ir ao conselho de psicologia para apresentar um projeto de cine-clube e plantão psicológico; de visitar o museu para o trabalho sobre o teatro; de tentar resolver (sem sucesso) a recepção de sinal de internet em casa – de longe vi a serra coberta por denso nevoeiro. A temperatura já subira o suficiente e agora seriam horas cobertos por úmido vapor que sobe do bosque. Uma vez em casa, enquanto ia estacionando em frente o Gravetos, barracão onde fica um fogão a lenha, o divisei atravessado por uns poucos raios solares vindos por entre uma moita de eucaliptos, marcados pelo desenho feito na cerração. Foi um espetáculo digno de efeito especial cinematográfico; alias o dia estava para efeitos especiais, o que se comprovou depois com revoadas de maritacas tipo maracanã, os ritos sexuais feitos de voos rasantes e sons roucos dos urubus, que há anos fazem seus ninhos em uma pedra acima de nossa morada, numa das dobras da serra.

Hoje, sábado, arrumamos a tulha, para que sobre espaço para as novas ferramentas que chegaram de Monte Santo, dia 18 passado. Fizemos a faxina geral da casa e colocamos ordem em dezenas de objetos que estavam mais ou menos sem lugar certo. Cansativo, mas extremamente útil, para quem necessita fazer as tarefas diárias no pomar, horta, plantações de subsistência e ainda dar conta da moradia. Quase sem móveis ou objetos supérfluos, é uma casa fácil de cuidar; ainda assim, precisa de uma arrumação mínima...Assistimos duas horas de tevê e fomos, ao final do dia, quase escurecendo, verificar se as saúvas e quenquens estavam atacando marias-sem-vergonhas, roseiras, espirradeiras, jabuticabeiras... E estavam! Deixamos nos buracos de suas entradas um produto granulado que tem a função de criar fungos em sua comida (as folhas sofrem uma oxidação dentro do ninho delas) e isso as desestimulam de procura comida naquela região. Foi o que fizemos...!