Adeus Serra do Cervo!

Você que lê este blog já me viu desistir de escrever nele uma outra vez, mas pelo motivo de não encontrar uma história que valesse a pena. Depois voltei atrás por saudades de falar de terra, de bichos e de meu estado de espírito nas serras. Bem, agora é definitivo! Não voltarei mais a este espaço para descrever minha lida pelas serras do Cervo, simplesmente porque não mais estarei por lá. Se vier a escrever sobre minha longa jornada por cada recanto daquele refúgio o será em outro blog, mas para dizer das saudades, reminiscências e imagens indeléveis desta vivência. Este blog será como uma árvore esquecida na retina do viajante em um trem que dispara pelo campo. Ou como mais uma lápide no grande cemitério da web. Grato àqueles que me brindaram com sua leitura. Antes de fechar de vez este espaço farei uma última blogagem, em respeito aos que me seguem. Manterei, limitadamente, o blog http://levileonel.blogspot.com

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

O cio na terra e nos ares!

     Mesmo com a chuva mirrada (que os vizinhos jocosamente chamaram de sereno) e com a terra rachada e desértica os caquis acabaram verdejando e apresentando as formações florais que depois virarão frutas. Alguns caquizeiros menos felizes despencaram suas próprias flores e frutos na esperança de gastar menos energia e conseguir produzir alguns frutos doces e carnudos. Dá pena ver o chão forrado de suas flores verdes! Mas a chuva só aparece no horizonte e caprichosamente rodeia por Pouso Alegre, Congonhal, Santa Rita do Sapucai e desaparece nos montanhas. Neste momento, o tal do "sereno", umedece discretamente as folhas do abacateiro e jabuticabeiras; do gramado irregular e dos pinheiros do pequenos bosque que ladeia a casa ao norte, antes do pomar.
     Porém, mesmo em tais condições precárias o chão dá mostra de ter entrado no cio. Por mais improvável que seja, as plantas brotam pequenos nós verdes em suas saias e já dançam, ainda que timidamente, ao sopro da primavera, que está ali na esquina do mundo, quase à vista. Prova disto, são os pássaros pretos se acasalando nas nespereiras e após a cópula dando um voo rasante e girando em torno da fêmea. Esta, depois deste sexo bem vindo, penteiam as penas besuntando-as de óleo do seu reservatório no traseiro, escondido pelas penas do rabo. Em seguida, sai como flecha lançada pelo bodoque do instinto que os une, na direção que tomou o macho. Só o deus dos passarinhos sabe o que farão escondidos na mata. Nós, pobre mortais só sabemos o resultado. Uma profusão de pássaros pretos pipiando atrás de seus pais em galhos de amoreiras tentando convencê-los a regurgitar em seus papos o que eles tem nos deles.
     Seu canto nupcial é uma das maravilhas da natureza! Nas tardes de primavera ouviremos por mais ou menos um mês a orquestra destas aves negras como carvão, incansáveis, até que seu negrume as confunda com o escuro da noite.
      Falando em amoreiras... Colhemos bastante amoras para uma geleia. Amoras roxas, pois as pretas e brancas ainda estão industriando os frutos. As roxas são generosas, deitando seus galhos até o chão para que não tenhamos trabalho em colher seus dulcíssimos frutos. As brancas dão em árvores grandes com espinhos terríveis e pontudos nos troncos e galhos; as pretas são arbustivas, com espinhos até no invólucro verde que as sustem. Não são nada generosas; no máximo aceitam que nossos concorrentes - aves em geral - as devorem com sofreguidão. 
      Bem, as roxas não são generosas só conosco; de seus frutos de um roxo profundo, alimenta-se uma multidão de viventes. Desde insetos a corujas, curiangos, morcegos, raposas, até ratos e gambás, só para ficar naqueles que a solicitam à noite. Mas, creio que é durante o dia que a amoreira atinge seu apogeu. Trata-se de uma verdadeira babel de sons dos mais variados tipos de aves a pousar em suas galhadas pontilhadas dos cobiçados frutos. A lista é grande, mas os mais evidentes e coloridos são tucanos, gralhas de rabos brancos e amarelos, canários da terra, jacus e pombas do ar - as populares "fogo-pagou".
      Então, ainda falando de amoras, acabamos de saboreá-las com biscoitos de maizena e queijo! Já tenho saudades dos meses que elas desaparecerão encolhidas em sabe-se-lá que meandros de sua árvore-mãe. Enquanto isso vou me esbaldando com os caquis... 
(a foto mostra o vão na serra onde estão enraizadas as amoreiras)