Adeus Serra do Cervo!

Você que lê este blog já me viu desistir de escrever nele uma outra vez, mas pelo motivo de não encontrar uma história que valesse a pena. Depois voltei atrás por saudades de falar de terra, de bichos e de meu estado de espírito nas serras. Bem, agora é definitivo! Não voltarei mais a este espaço para descrever minha lida pelas serras do Cervo, simplesmente porque não mais estarei por lá. Se vier a escrever sobre minha longa jornada por cada recanto daquele refúgio o será em outro blog, mas para dizer das saudades, reminiscências e imagens indeléveis desta vivência. Este blog será como uma árvore esquecida na retina do viajante em um trem que dispara pelo campo. Ou como mais uma lápide no grande cemitério da web. Grato àqueles que me brindaram com sua leitura. Antes de fechar de vez este espaço farei uma última blogagem, em respeito aos que me seguem. Manterei, limitadamente, o blog http://levileonel.blogspot.com

sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

Experiência, maravilhar-se, viver!


        "Todo discurso sobre a experiência deve partir atualmente da constatação de que ela não é mais algo que ainda nos seja dado fazer. Pois, assim como foi privado da sua biografia, o homem contemporâneo foi expropriado de sua experiência: aliás, a incapacidade de fazer e transmitir experiências talvez seja um dos poucos dados certos de que disponha de si mesmo". Esta "destruição" da experiência, segundo Agamben, pode ser o resultado da banalização da vivência cotidiana onde o cidadão volta "para casa à noitinha extenuado por uma mixórdia de eventos - divertidos ou maçantes, banais ou insólitos, agradáveis ou atrozes - entretanto nenhum deles se tornou experiência".
       É nisso que venho tentando meter a colher já há três décadas, quando insto as pessoas, por meio de técnicas de si advindas do Samkhya, do Zen, do Tao e das artes existenciais de cada uma destas experimentações do mundo. Portanto, se por um lado acho que Agamben cada vez mais tem razão (ele escreveu isso em 1977/8), esclareço que essa foi, e é, a batalha de muitos sistemas filosóficos indianos e orientais para que se mantenha íntegra a capacidade para fazer experiência. Centro a atenção nas práticas chamadas 'sadhana', que surgiram no período matriarcal, pré-védico e algumas técnicas aprendidas nas artes marciais chinesas, as quais ensinei entre o fim dos anos 70 e fim dos 90.
      O homem de que trata o autor é o homem ocidental, e isso nos autoriza, embora não se resolva nisso, a dizer que não é a mesma realidade naquelas sociedades. Não quer dizer que não sejam atacados, neste século, pela mesma 'doença'; a globalização tem tentáculos infernais e de alcance inimaginável! Mas podemos propor, com uma margem de segurança, que seus modos de realizar sua subjetividade ainda inclui a "experiência" e é isso que venho descortinando, embora com as limitações de ser um ocidental, solapado pelo mesmo fenômeno.
      O autor rebusca, de modo primoroso, a perda da autoridade advinda da experiência, uma vez que a verdadeira autoridade prescinde da indústria do comportamento ou dos manuais de auto-ajuda. Na verdade, os manuais e as técnicas de aprendizado, por mais bem intencionados que se coloquem, só fazem destruir a "experiência". No ato mesmo de treinar um comportamento, ou ensinar uma verdade, ou propor um sistema de pensamento positivo, acabam por retirar o sujeito desta incerteza criativa que é o cimento para a experiência; é o fim deste "jogado no mundo" sartriano, onde o homem pode, pelo gratuito da vida compor-se como "clareira" vivencial - experiência, pois.
      Na penúltima postagem do blog http://levileonel.blogspot.com, dia 18 de fevereiro, perguntei, junto com Mathieu, personagem sartriano, como fazer para que minha vida não malogre, ou que faça algum sentido, ou que seja uma vida que faça mais que um breve alarido sobre o mundo. Creio que um bom começo é resgatar, mesmo que sem sendas demarcadas, demarcações que impossibilitam a vivência de uma "experiência". A natureza mesma desse fenômeno é a de que desdiz a aprendizagem, por isso não se dá na presença da simples técnica, embora sem a técnica jamais se dê, paradoxalmente. Uma vez Sartre propôs o termo fulguração para esse sentimento de ser clareira no mundo, ou do mundo; talvez eu devesse seguir minha investigação por aí... pela fulguração do homem como instante vivencial sem eira nem beira, e por isso mesmo, especialmente significativo...

Sobre as vivências que dirijo em SP: http://levileonel.blogspot.com

domingo, 21 de fevereiro de 2010

A insustentável leveza do ser!

Tomo emprestado o nome do filme e livro para tratar de um tema singelo, de minha perspectiva, e trágico, da perspectiva do marimbondo. É! Não enlouqueço ainda! Trata-se da longa contemplação de uma caixa de marimbondos de bunda branca que escolheram o teto de minha pequena área para construir sua descendência. Atarefados e até certo ponto meio estabanados ao aterrissar sobre sua "casa", não raro pousavam sobre as costas rajadas de seus colegas, provocando um certo agito de asas em cadeia, que acabava por afetar a todos. Esse ir e vir de cada um deles, marcado por um voo que me pareceu também, em certa medida, meio alheado, me fazia meditar se era uma estratégia qualquer, que, lamento, não pude decifrar. No meio desta meditação tenho a surpresa desagradável de ver um dos inusitados vizinhos se enroscar nas teias de uma aranha que, e isso posso assegurar, a tecera como estratégia para pegar insetos e, quem sabe, seus vizinhos belicosos. Tive ímpetos de libertá-lo, argumentando que a aranha teria outras oportunidades para seu almoço. Vacilei um pouco, pensando que não deveria me meter em assuntos de terceiros, mas decidi entrar e pegar uma cadeira para com um varinha, delicadamente, desemaranhá-lo. Sabia que não podia demorar; as aranhas que "cultivo" ali, assim como os marimbondos, são seres determinados! E não deu outra! Ao voltar lá estava a aranha a poucos milímetros de sua presa, que nestas alturas, por desespero de causa, mais se enrolara. Por instantes me vi ali pensando o que fazer. Pela segunda vez decido que salvarei o marimbondo! Mas, era tarde. A aranha, num golpe certeiro, já o aferroara (ou o enredara, não sei) e seus movimentos já eram estertores de morte. Alguns instantes menos e teria salvo sua vida. Era sua única chance e falhei enquanto pensava nos direitos da aranha, que ela também é filha-de-deus, que é gente como a gente etc. Essa é a insustentável leveza do ser, a inefável seidade da existência! E mais! Eu posso ser a próxima vítima, não da aranha, que não ousaria enrolar um almoço tão volumoso, mas das teias do acaso, que alguns chamam "sorte", "fortuna" ou "Deus".