Anteontem, numa viagem que normalmente se dá em três horas, meu ônibus gastou cinco horas e meia; Não por causa do excesso de veículos (que de fato havia!), mas por causa de um engavetamento com com vários carros, sendo o meu ônibus um dos responsáveis! Ficamos horas na Fernão Dias, entediados, impacientes, sob chuva milimétrica e fria, parecendo mais molhada que as chuvas de verão. Os pingos, no outono e inverno, não desabam. Eles deslizam uns apoiando-se noutros, mas sem juntarem-se. Ficam de ombros próximos, por causa de sua debilidade de tamanho. São fiapos de pingos; qualquer brisa e descem meio de resvalo, de lado, encharcando antes de molhar. Para usar a situação a meu favor, li alguns capítulos de “A teoria do amadurecimento de D. W. Winnicott” de Elsa Dias e o capítulo XXV de “Da pediatria à psicanálise” do próprio W. (para um curso de extensão que darei sobre delinquência – a tendência anti-social) e revi meu artigo sobre o Teatro Municipal de PA. Conversei com os vizinhos de poltrona: um deles veio de Marabá no Amapá (viajava desde o início da madrugada migrando de aeroporto a aeroporto até que embarcara naquele ônibus em direção a Boa Esperança. Noutra conversa fico sabendo que uma garota de dezessete anos aproximados estudava em SP para os vestibulares de medicina. Com seu boné estiloso, xadrez de branco e preto, manipulando concentradamente os apontamentos de matemática, que era seu “grande problema com os vestibulares”. Boa de papo, sorrindo acolhedora com seus grandes dentes alinhados, brancos e limpos, com o anoitecer ela foi arrefecendo de cansaço. Escureceu umidamente. O ônibus finalmente arrancou e ela puxou o boné sobre os olhos. Um a um, praticamente todos mergulhamos em nossos mundos feitos um tanto de sonolência, outro tanto de pensamentos, reminiscências e esperas. Ontem, depois de ficar afundado, por horas, no mundo lacunar do sono e dos sonhos, acordei restaurado. Pela janela que dá para os pinheiros, azeitonas do ceilão, roseiras e mangueiras, vi espessa cerração que dava a cada árvore aspecto espectral; mais se via seus contornos, que detalhes. Mas, como as conheço de nascimento, sei que uma é roseira amarela, outra é uma agave verde acinzentado, outra ainda, uma mangueira espada. Fiz o café da manhã, simples e eficiente; Vania levanta-se; Rabicho, Soneca, Kelly e Gabi são convidados a entrar. Eles também são alimentados; já calmos nas entranhas cada um procura seu lugar na casa para a dormitação que se anuncia. Lá fora começa aquela chuva fina, cujo ofício é encharcar o mundo... Sem condições para trabalhar a terra, fizemos nossas leituras da vez – eu li um capítulo do “Tratado da Eficácia” e outro de “O ser e o nada”. Para treinar o francês, “Madame Bovary”. Vania leu mais um pouco do “Tratado de ateologia” e em certo momento quer saber porque Michel Onfray diferenciou “teístas”, “deístas” (menos cegos) e “ateístas” (mais lúcidos). Veja na terça que vem http://www.levileonel.blogspot.com).
Mais tarde descemos a serra até a casa de Zé Maria e Amanda para um almoço aconchegante. Conversas mais ou menos esparsas com novos conhecidos e outros já conhecidos de um bingo no Clube Literário; tratamos um futebol para qualquer dias desses – o ridículo é que não jogo desde os treze anos de idade. Será um desastre que só dará video-cacetada e bola-murcha para apresentação em tevê para divertimentos dos espectadores. Pelo menos de minha parte a diversão estará garantida. É mais que certo que riremos a beça!
E depois, como continuou chovendo, escrevi e li. Além, é claro, de alguns cuidados domésticos, sem os quais fica impraticável morar... A noite um pouco de tevê assistindo um seriado brasileiro.
Hoje, 12, o dia amanheceu plúmbeo, como diziam os clássicos, frio, úmido; nenhuma brisa, o que mantem a temperatura razoavelmente mais alta que a de ontem. Daqui a pouco vamos a PA para a compra de provisões e ir à biblioteca da UNIVÁS. Neste momento, escrevendo estas linhas, chego a conclusão de que devo comprar um dicionário com a renovação ortográfica, para praticar e não passar apuros quando terminar o prazo para que todos a adotem. Já uso um pouco de memória, por ter lido um ou outro livro e artigo que já usam a nova ortografia, mas não é o suficiente. Tenho que aprender as regras gerais, senão terei que usar o dicionário muitas vezes por dia...
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